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Desaposentação

Publicado em: 24 de maio de 2013

Por vezes, a aposentadoria não representa a tranqüilidade tão sonhada depois de tantos anos de trabalho. Muitas pessoas, ao ter o direito de se aposentar, continuam a trabalhar, para ocupar o tempo ou para manter o padrão de vida alcançado. Mas, a maioria trabalha por necessidade financeira. Muitos dos aposentados brasileiros ganham até dois salários mínimos, ou seja, pouco mais de R$ 1 mil por mês. Por esse motivo, não é raro que o aposentado queira voltar a exercer função remunerada para conseguir driblar as contas e o custo de vida.

Para tentar aumentar a renda, algumas pessoas recorrem a uma possibilidade que não existe no ordenamento jurídico brasileiro, a desaposentação, que nada mais é que a renúncia à aposentadoria. O segurado abre mão do benefício, volta ao mercado de trabalho em regime da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), ou seja, com carteira assinada, e segue contribuindo para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

No entanto, o INSS, por ser uma autarquia federal, faz parte da administração indireta, estando submetido à regra da legalidade positiva, ou seja, cabe ao órgão fazer somente o que a lei permite. Sendo assim, não poderia deferir administrativamente qualquer pedido de renúncia de aposentadoria. Aqui se estabelece a primeira divergência: o cidadão pode fazer tudo aquilo que a lei não proíba. Nesse ordenamento, não há nenhuma lei específica que impeça a desaposentação. Embora não exista proibição legal, o Decreto 3.048/99, artigo 181-B, prevê que "as aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela Previdência Social, na forma deste regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis".

O parágrafo único desse mesmo artigo completa: "O segurado pode desistir do seu pedido de aposentadoria desde que manifeste essa intenção e requeira o arquivamento definitivo do pedido antes da ocorrência do primeiro de um dos seguintes atos: I - recebimento do primeiro pagamento do benefício; ou II - saque do respectivo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou do Programa de Integração Social".

O decreto, por ser uma norma subsidiária, tem a função de garantir a fiel execução da lei, de acordo com o artigo 84, inciso IV, da Constituição da República de 1988, não podendo restringir a aquisição de um direito do aposentado para prejudicá-lo. Até que alguma lei que regulamente o assunto seja promulgada pelo Congresso Nacional, caberá ao Poder Judiciário decidir sobre o tema, o que gera diferentes decisões sobre o mesmo caso, já que são vários julgadores analisando os mais variados processos.

Com a complexidade inerente ao tema, é preciso esclarecer alguns pontos para facilitar o entendimento. A aposentadoria é um benefício, uma prestação pecuniária concedida pela Previdência Social de forma permanente ou temporária, que garante a subsistência do segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS). O benefício pode ser concedido uma vez que o segurado esteja impossibilitado de trabalhar por causa da idade ou por motivos de doença física ou mental, bem como pelo simples fato de preencher o tempo de contribuição para o Regime Geral.

Ocorre que a aposentadoria é um direito individual, além de ser personalíssimo e, aos cidadãos, é dado o direito de fazer tudo aquilo que a lei não proíba. Sendo assim, o beneficiário poderia desistir da concessão do benefício visando a uma melhoria dos valores que futuramente vier a receber. O segurado que já obteve a sua aposentadoria pode renunciar ao direito de se manter aposentado, caso ele queira continuar trabalhando e contribuindo para o INSS.

Segundo os renomados doutrinadores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari a "desaposentação é o direito do segurado ao retorno à atividade remunerada, com o desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins de aproveitamento do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previdenciário". O ponto polêmico nesse assunto diz respeito à obrigatoriedade da devolução dos benefícios já recebidos a título de aposentadoria. Esse tema ainda é uma zona de incertezas no âmbito da jurisprudência nacional.

Existem julgadores e doutrinadores que defendem a devolução do montante recebido no período em que o segurado esteve aposentado, caso ele renuncie à aposentadoria. A alegação é de que a prática caracterizaria o enriquecimento ilícito. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se manifestou no sentido de que a renúncia à aposentadoria é possível, não sendo necessária a devolução dos valores já recebidos no tempo em que se deu a aposentadoria, tendo em vista a natureza alimentar dos pagamentos.

Sendo assim, é possível que o segurado reaproveite o tempo de contribuição para fins de concessão de benefício no mesmo regime ou em outro regime previdenciário, visto que os valores recebidos a título de aposentadoria têm caráter alimentar e por esse motivo é dispensável a devolução do montante recebido no período em que esteve aposentado.

Na busca de soluções definitivas, dois projetos de lei estão em discussão no Congresso Nacional: um para regulamentar a desaposentação, e outro para acabar com a contribuição dos aposentados que voltam a trabalhar. São caminhos opostos que irão solucionar o problema. Independentemente de qual proposta se transformará em lei, a esperança é que, pelo menos, as pessoas que trabalharam e contribuíram por toda a vida para a Previdência, tenham de volta o que foi pago quando se aposentarem ou quando decidirem parar de vez de trabalhar. É preciso que haja uma unidade nas decisões para que o beneficiário seja, de fato, beneficiado pela decisão.

Liliane Martins Breyner

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